Paolo Moretti
Eu nunca fui um homem corajoso.
Ambicioso, sim. Ganancioso, também. Mas corajoso?
Não.
Sempre fui mais esperto que valente. Aprendi cedo que quem se mete no meio de monstros precisa rastejar, sorrir, obedecer — e sobreviver.
E agora, eu estava prestes a morrer.
Fazia três dias que Aurora havia escapado, e ainda não havia nenhum rastro claro dela. Nenhuma pista concreta, nenhuma gravação de câmera útil, nenhum informante confiável o bastante para me dizer: “ela está aqui, Paolo.”
Só existia uma certeza:
Ela sumiu.
E Dante Vitale... está por um fio de me despedaçar.
Ele não é como os outros Dons. Não grita à toa. Não manda matar por impulso. Quando Dante fica calado demais... é aí que você precisa começar a cavar sua própria cova.
Hoje, ele estava calado.
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— CHEFA! — gritei para minha secretária pelo interfone. — Manda entrarem agora. Quero os três sentados na minha frente em dois minutos ou mato alguém por engano!
Os três informantes entraram no meu escritório às pressas. Eram homens comuns — pagos para ouvir, pagar, calar. Eu os mantinha nos cantos escuros da cidade, escutando conversas nos prostíbulos, bares, mercados negros, corredores de hospitais e beiradas de estradas.
— Fala, p***a! — exigi, passando a mão suada na careca. — Ninguém aqui vai sair vivo se eu não souber o paradeiro dessa garota.
— Ouvimos algo — disse o primeiro, com a voz hesitante. — Sobre um grupo de empregados que encontraram uma garota desacordada… perto da fronteira mexicana. Próximo à estrada velha, onde os navarros têm propriedades.
— Que navarros?
— Os... os Navarro, senhor. A família do Don Elías.
Eu congelei.
— Você tá me dizendo… que ela foi parar no território do Elías Navarro?
Os três ficaram em silêncio.
Mas a verdade já tinha caído feito uma maldição nos meus ombros.
A p***a do destino jogou ela direto no colo de um dos homens mais perigosos do continente.
E justo agora… agora que Dante a quer mais do que qualquer coisa.
Me levantei com a força de quem sente o peso da própria sentença nas costas.
— Vocês têm certeza?
— Um dos criados que trabalha nos campos disse que viram uma garota sendo levada pelos seguranças do Elías. Ela estava ferida, descalça, sangrando… mas viva. E ele mandou tratá-la.
— E por que, diabos, isso ainda não tinha chegado até mim?!
— Estávamos confirmando, Paolo! Elías é discreto. Ele tem cercas, câmeras próprias, matam informantes no primeiro deslize… não é fácil se infiltrar.
Afastei os papéis da mesa com um soco e comecei a andar de um lado pro outro.
— Merda. Merda! MERDA!
Se Dante descobre isso antes de mim, eu tô morto.
Se Dante achar que eu vendi a menina direto pro Navarro, eu tô mais que morto — tô torturado.
Elías não é aliado. Nunca foi.
A máfia mexicana só respeita uma coisa: sangue derramado.
E se ele descobriu quem é Aurora… se ele já SABE que ela era destinada a Dante… ele vai querer manter por pura provocação. Pra declarar guerra.
Ou pior: por capricho.
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Sentei na poltrona com os olhos arregalados.
Preciso recuperar ela. Agora. Antes que alguém abra a boca.
— CHAMA RAMON! — berrei. — PREPARA O HELICÓPTERO! VAMOS PRA FRONTEIRA HOJE À NOITE!
— Você vai invadir o território de Elías? — perguntou o informante, pálido.
— Eu não vou invadir. Eu vou negociar.
E se não der certo…
Eu mato até o cachorro dele.
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O trajeto foi infernal.
Cada minuto dentro daquele helicóptero só fazia minha mente correr mais rápido que a hélice. Eu transpirava, tremia, rezava. Pensava em Dante. Pensava nos gritos. Pensava em como ele sorri antes de arrancar um dedo de alguém.
Quando pousamos, tudo era poeira e tensão.
Dois carros blindados nos esperavam.
Os homens de Elías não disseram uma palavra.
Nos levaram por caminhos tortuosos, cercas elétricas, guardas armados até os dentes.
Eu não sabia se estava indo para negociar… ou para ser enterrado.
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Fui deixado numa sala de pedra, escura e fria.
Com uma cadeira e uma mesa.
Nada mais.
Fiquei ali por quarenta minutos.
Até a porta se abrir, e Carmen — a mulher de confiança de Elías — entrar.
— O Don Navarro está ocupado.
— Eu não vim pra incomodar. Vim pra negociar.
Ela me olhou com nojo.
— Você perdeu o direito de negociar no momento em que deixou uma menina inocente fugir.
— Ela é propriedade do Dom Vitale!
— Ela agora está sob proteção de Navarro.
— ELE ROUBOU ELA DE MIM!
— Ele a salvou de você.
Bati a mão na mesa, furioso.
— ESCUTA AQUI, DONA! Essa garota não é santa! Ela foi LEILOADA! Vendida! O Dante quer ela de volta. Ele vai declarar guerra se souber que ela tá aqui!
Carmen inclinou a cabeça, irônica.
— Talvez ele devesse ter protegido melhor quem dizia querer tanto.
Me joguei contra a cadeira.
— Eu preciso vê-la. Só isso. Só UMA vez. Saber que ela está viva. Que está sendo bem tratada. E que posso dar um jeito de levá-la de volta antes que alguém descubra.
Carmen suspirou.
— O Don sabe que você viria. Mas não vai permitir contato. Nem entrega. Ela agora é dele. E, se Dante quiser, que venha buscá-la pessoalmente.
Me levantei.
— Isso é uma declaração de guerra.
— Talvez.
Mas quem declarou essa guerra… foi você.
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Na volta para o helicóptero, eu não falava.
Não respirava.
Não sentia as pernas.
Porque agora eu sabia de duas coisas:
1. Aurora está com Elías Navarro.
2. Dante ainda não sabe.
E quando ele souber…
Eu vou precisar de um caixão.
Ou um milagre.
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No helicóptero, o barulho das hélices era menor do que a gritaria dentro da minha cabeça. Cada segundo era uma contagem regressiva. Dante não era paciente. Se não tivesse notícias, se não sentisse progresso, ele ia supor o pior. E o pior, dessa vez, sou eu.
Apertei o botão do interfone interno e gritei com o piloto:
— Vai mais rápido, p***a! Se eu morrer, tu cai junto nessa merda!
Nem sei se ele ouviu, mas o helicóptero balançou. Tomei mais um gole do uísque de bolso que sempre carrego. Estômago vazio. Mente a mil. Mãos suadas. E um único pensamento:
Tenho que trazer essa garota de volta. Nem que seja em pedaços.
Elías não vai devolver ela fácil. E não é só orgulho. Não é só provocação. É desejo. Eu conheço homens como ele. Vi como olhava pra ela nas fotos da câmera de segurança quando os empregados dela acharam Aurora desacordada. Não era compaixão.
Era posse.
A p***a do mexicano ficou obcecado pela menina que era do Dante.
E agora?
Agora eu tô no meio de dois monstros. Um me acha incompetente. O outro quer brincar de boneca com a mulher errada.
E eu?
Eu tô fodido.
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Assim que pisei de volta em Roma, fui direto pro meu apartamento. Tranquei as portas. Fechei as janelas. Liguei para meu homem de confiança.
— Quero três alternativas de plano de extração. Um com suborno. Um com sequestro. E um com morte. Entendeu?
— Mas Paolo, se ela tá com o Navarro, como...
— CALA A BOCA E OBEDECE!
Desliguei antes que ele começasse a argumentar.
A essa altura, eu já nem pensava em lucro. Nem em repassar ela pro Dante. Eu só queria continuar vivo. Só queria entregar a garota e sumir do mapa antes que minha cabeça fosse parar numa bandeja.
Se Navarro não entregar ela por bem, eu vou tirar por m*l.
Mesmo que eu tenha que atravessar o México com um exército de aluguel.
Mesmo que ela saia de lá desmaiada.
Mesmo que…
Mesmo que já tenha sido tocada.
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Deitei na cama e olhei pro teto.
Respirei fundo.
E falei sozinho:
— Você é só uma garota, Aurora... Mas é a garota que vai me matar se eu não for mais rápido que todos esses filhos da p**a.
Então, bati o copo de uísque na mesa de cabeceira, e sussurrei:
— Amanhã... amanhã, eu começo a guerra.
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