Aurora
Desde a noite do pacto, algo em Elías havia mudado.
Ele não me olhava mais da mesma forma.
Antes, era controle. Frieza. Observação.
Agora… havia algo mais. Algo que parecia pesar sobre ele como uma culpa.
Ou um dever.
Ele não me tocava. Mas também não se afastava. Passava longos minutos parado na varanda, olhando o horizonte como se estivesse esperando por um veredito.
E todas as noites, à mesma hora, Carmen subia para falar com ele.
E todas as noites, ele a dispensava com um aceno curto.
O silêncio gritava.
E eu comecei a desconfiar que aquele casamento… não estava terminado.
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Foi na terceira manhã que a sensação virou certeza.
Desci para o salão e encontrei a mesa de jantar posta para dois. Elías não estava ali, mas o prato dele já estava coberto. O meu, impecável. E ao lado do meu lugar… um lençol branco dobrado com precisão.
Fingi não ver. Mas meu corpo gelou por dentro.
Comi em silêncio. Com as mãos tremendo.
E depois, fui atrás da única pessoa que me diria a verdade: Carmen.
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— Ele está estranho — falei.
Ela não respondeu.
— Desde o pacto. Ele m*l fala comigo. Evita até me encarar por muito tempo.
— Você notou.
— O que está acontecendo?
Ela suspirou. Largou o que fazia e me olhou com seriedade.
— O Conselho veio até ele.
Meu coração acelerou.
— Por quê?
— Estão exigindo… a prova da consumação.
— Consumação?
— O casamento, Aurora. Selado no sangue, sim. Mas para os anciãos… não basta. Eles querem o resto.
— O resto? Você tá falando de…?
— Da sua virgindade, sim.
Senti o mundo girar por um segundo.
— Eles querem que ele… me prove?
— Eles querem um lençol manchado. Uma confirmação física. Sem isso, o pacto pode ser invalidado.
— E ele... aceitou?
— Ele não teve escolha.
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Eu me afastei. A pele em brasa.
— Isso é humilhação.
— É tradição.
— Isso é primitivo!
— É a única forma de manter você viva, Aurora. Se o pacto for considerado inválido, você se torna vulnerável. E vulnerável, aqui, é igual a morta.
— E se eu recusar?
Carmen me encarou.
— Elías perderá o direito de te manter. O Conselho pode exigir que você seja levada a outro Dom. Pode ser afastada. Vendida. Silenciada.
Me apoiei na parede, tentando respirar.
— Ele vai me forçar?
— Não.
— Como você sabe?
— Porque ele é Elías Navarro. E se ele quisesse te forçar, teria feito na primeira noite.
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As palavras dela deveriam me tranquilizar.
Mas o que eu sentia era uma colisão dentro de mim.
Parte de mim queria correr. Sumir. Fugir do peso de ser propriedade marcada por sangue e sexo.
Mas outra parte…
Uma que eu odiava…
queria entender o que havia nos olhos dele quando me olhava.
E se…
Se não fosse só obrigação?
E se ele me desejasse?
E se… eu desejasse também?
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Naquela noite, ele bateu na porta.
— Posso entrar?
Assenti em silêncio.
Ele entrou devagar. A cadeira deslizando com leveza.
— Está tudo bem? — ele perguntou.
— Carmen me contou.
Ele fechou os olhos por um instante.
— Imaginei.
— Você vai me tocar?
Ele respirou fundo.
— Não.
A não ser que você me peça.
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O silêncio entre nós era como fogo.
— E se eu não pedir?
— Então eu sangro sozinho.
— E o Conselho?
— Vai receber o que precisa…
Ou vai aprender a temer o que não pode controlar.
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Ele se virou para sair. Mas antes…
— Elías…
— Sim?
— Se eu pedisse…
Seria por mim. Não por eles.
Ele não sorriu. Mas os olhos dele…
Os olhos queimaram.
— Então, quando estiver pronta… eu estarei aqui.
E ele se foi.
E eu fiquei ali, com o lençol dobrado nas mãos…
e o coração pela metade.
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